No passado dia 22 de Julho, o Conselho Nacional das Ordens Profissionais, que reúne associações públicas com mais de 220.000 profissionais, divulgou o início da recolha de assinaturas para uma petição que solicita à Assembleia da República a atribuição da equivalência do grau de mestre, na designação pré-Reforma de Bolonha, aos titulares de anteriores licenciaturas com formação superior de 5 e 6 anos.
A petição é aberta a todos os cidadãos que se sintam indignados pela injustiça produzida pela legislação da Reforma do Ensino Superior, dita de Bolonha, que passou a designar por licenciatura as formações de 3 anos, quando muitas centenas de milhares de portugueses tiveram que estudar 5 ou 6 anos, antes da reforma, para obter o mesmo grau académico de licenciado. Para a formação de 5 anos, após a reforma, o grau atribuído passou a ser o de mestre.
Não nos parece que em Portugal o ensino básico e secundário tenham evoluído tanto que permita aos alunos que pretendem entrar para o ensino superior tenham formações mais elevadas do que as obtidas antes da reforma. Por outro lado, também não é credível que os novos alunos do ensino superior, após a reforma, tenham uma capacidade excepcional, face aos anteriores, para obterem em apenas 3 anos a formação e as competências que os antigos alunos, com os mesmos professores, apenas conseguiam em 5 ou 6. Não se trata de ilusionismo, mas de simples branqueamento, por decreto, das diferenças entre as formações de 3 e de 5/6 anos. O mercado reconhece as diferenças, mas os concursos para admissão na administração pública ignoram-nas, colocando no mesmo nível de formação os antigos e os novos licenciados.
Mas não são apenas os antigos licenciados os prejudicados. Também os antigos mestres, que após 5/6 anos de ensino superior ainda tiveram que obter uma formação adicional de 2 anos, assistem agora à atribuição do mesmo grau ao fim de apenas 5 anos.
Esta prodigiosa transformação do saber e dos graus ficou a dever-se ao DL 74/2006, e foi completada pela Portaria 782/2009, que estabeleceu a Regulamentação do Quadro Nacional de Qualificações, e no qual o bacharelato (designação da formação de 3 anos antes da reforma) e a licenciatura foram colocadas no mesmo nível 6, sem diferenciar se as licenciaturas foram obtidas em 3 ou 5/6 anos. No nível 7 aparece apenas o grau de mestre, englobando formações pós reforma com 5 anos, e os antigos mestres com 6/7, ou mais anos.
Apesar de três ministros, Ciência, Trabalho e Educação, terem recebido proposta para correcção da portaria, entenderam manter o que não é compreensível, nem aceitável num Estado de direito.
A esmagadora maioria dos países da UE não aplicou o modelo português, mas por cá insistimos sempre no caminho da facilidade e da melhoria das estatísticas por via administrativa, e por isso temos uma "reforma à bolonhesa". De facto, se olharmos para o nosso sistema de ensino, ainda existem outros problemas mais graves, como sejam: as baixas notas nas disciplinas que deveriam ser específicas para acesso ao ensino superior e consequente dispensa das mesmas para que as escolas tenham alunos e financiamento; a crescente iliteracia e grave aumento da indisciplina nas escolas. Se juntarmos a proibição dos alunos chumbarem, então teremos a escola perfeita, sendo suficiente um balcão na loja do cidadão para os pais solicitem que seja atribuído aos filhos o grau académico que mais lhes convier.
Contudo, o sentido da justiça e o direito à indignação ainda não desapareceram da nossa sociedade. Decorridos apenas 18 dias sobre o início da petição, com recolha de assinaturas na Internet, http://peticaopublica.com/PeticaoVer.aspx pi=pet1 mais de 14.000 cidadãos já a subscreveram, sendo a mais activa, e ocupando já a 7.ª posição entre as mais subscritas.
Só é lamentável que se tenha que recorrer a uma petição para se exigir o evidente.
Presidente do Conselho Nacional das Ordens Profissionais, ex- bastonário da Ordem dos Engenheiros