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Equívocos

por papinto, em 13.06.15

JOSÉ FIGUEIREDO Público 13/06/2015 - 05:16

O equívoco entre ciência, tecnologia e o papel do engenheiro e da engenharia na sociedade não ajuda, a meu ver, ao desenvolvimento de políticas ajuizadas.

O artigo publicado no dia 11 de Junho no jornal PÚBLICO (Portugal, país de excelência em engenharia) pelo professor Marçal Grilo, que já teve responsabilidades políticas ao mais alto nível, refere repetidamente “na área das engenharias e das tecnologias”, “formações nas engenharias e nas tecnologias”, “olhar para as engenharias e para as tecnologias com atenção redobrada”.

Acontece que, para mim, com certeza por erro meu, estas formulações não têm sentido. Por um lado estamos a falar de olhares diferentes e sensibilidades distintas, olhar para a engenharia significa olhar para a prática, para o eventual porquê dessa prática e/ou para o eventual ensino dessa prática, já olhar para a tecnologia visa o olhar para o artefacto, a tendência dos artefactos e coisas assim. Por outro lado, é preciso perceber até que ponto o olhar para a engenharia não contempla já o olhar para a tecnologia? Se assim não for de que ponto de vista se olha para a tecnologia?

O artigo prossegue com algumas referências como as iniciativas louváveis nos Centros de Ciência Viva, nos Clubes de Ciência, e outras da mesma natureza. Uma natureza que para mim, com certeza por erro meu, estará mal posicionada.

No país da Excelência em Engenharia continuam os equívocos e continuam sempre ao mais alto nível. A ciência é um ingrediente básico da engenharia, melhor, da formação em engenharia, mas a engenharia não é uma ciência. A engenharia lida com a formulação e resolução de problemas em contextos específicos, reais e não laboratoriais, e lida com problemas que muitas vezes não se conseguem definir completamente. Este carácter prático de fazer, por vezes em ambientes mal definidos, é uma característica da engenharia, da prática da engenharia e que deveria guiar a formação em engenharia. Engenharia que entretanto faz o quê? Tecnologia!

Se atentarmos nos modos de existência de Bruno Latour, em ciência a procura do interlocutor é a procura de imutáveis móveis. Pretendem-se criar referências. Por exemplo com um mapa podem-se referenciar espaços e conceitos. Os imutáveis móveis atravessam domínios rearranjando formas, embora mantendo o sentido das coisas. O mapa é um imutável móvel do domínio da ciência. Em termos de tecnologia a procura é de coisas que, substituindo outras, criem novos comportamentos estáveis. A ideia de estabilidade é fulcral em tecnologia. Por exemplo, numa estrada lisa, criar lombas para redução de velocidade vai alterar o comportamento dos condutores, mas a estrada é a mesma e os condutores também. A lomba é o artefacto tecnológico, de baixa tecnologia neste caso. Mas eficaz. Neste contexto o engenheiro é um actor que, apetrechado com ciência, inventa ficções capazes de criarem/construírem tecnologias.

O equívoco entre ciência, tecnologia e o papel do engenheiro e da engenharia na sociedade não ajuda, a meu ver, ao desenvolvimento de políticas ajuizadas quanto ao ensino de engenharia, nem quanto à consciência que o engenheiro deve ter sobre o seu próprio papel social e organizacional.

Professor no Instituto Superior Técnico (IST)

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A produtividade dos cientistas

por papinto, em 13.03.14

MIGUEL MOTA 

 

O que foi feito de bom pela Ciência, especialmente durante os governos do PS, não chegou para compensar a destruição dos grandes laboratórios do Estado.

 

O que foi escrito no Expresso de 8/2/2014, com o título “produtividade dos cientistas provoca polémica”, obriga a recordar alguns factos.

O que foi feito de bom pela Ciência, especialmente durante os governos do PS, não chegou para compensar a destruição dos grandes laboratórios do Estado, que já vinha de trás mas foi muito intensificada naquele período. Além de produzirem ciência internacionalmente reconhecida e citada, esses laboratórios ajudaram e muito a economia do país.

A destruição obedece a uma “lei”, não escrita mas religiosamente seguida, que não quer que exista investigação científica pública fora das universidades. Há anos que denuncio essa lei criminosa, que já causou ao país prejuízos enormes, científicos e económicos mas, como noutros casos, tem sido “bradar no deserto”. Uma universidade consegue apropriar-se de um desses laboratórios ou, então, destrói-se. Já conseguiram apropriar-se de, pelo menos, dois. Já tenho referido que, como professor universitário, me sinto insultado por tal prova de mediocridade e inveja que, repito, já causou ao país prejuízos enormes, na investigação e na economia, extinguindo o valiosoknow how que tinha sido acumulado. Não sei como os ministros dos sectores que exigem investigação científica para bem cumprirem a sua missão toleram tal sistema.

O primeiro dos grandes laboratórios foi a Estação Agronómica Nacional, criada em 1936. Para ela foi estabelecida a carreira de investigador científico, paralela da carreira docente universitária. Em 1942 apareceu a Estação de Melhoramento de Plantas, em Elvas, um laboratório mais pequeno e dedicado a uma especialidade. Dez anos depois da Estação Agronómica, foi fundado o Laboratório Nacional de Engenharia Civil, essencialmente decalcado dela mas podendo defender-se de algumas limitações impostas à Estação, a principal das quais nascer como Direcção-Geral em vez de estar subordinado a um director-geral. Outros laboratórios foram criados posteriormente, sempre dentro do mesmo modelo.

O que aqueles três laboratórios deram ao país, em termos económicos, foi certamente muitas vezes o que o Estado neles investiu. Infelizmente, apesar de eu já o ter proposto, não conheço valores dos resultados económicos da investigação produzida. Na celebração dos 25 anos da Estação de Melhoramento de Plantas, em 1967, o secretário de Estado da Agricultura disse que, para uma despesa total de escassas dezenas de milhar de contos investidos no organismo, a agricultura – e, portanto a economia – tinha recolhido, a mais, pela utilização das variedades de cereais e forragens criadas na Estação, um valor estimado em um milhão de contos. Lembro que a uva D. Maria, de bagos muito grandes e ligeiro gosto a Moscatel, é resultado da investigação realizada na Estação Agronómica.

Há anos, uma antiga ministra da Ciência lamentou-se, num jornal, dizendo que, apesar de ter aumentado o número de papers (artigos científicos), a economia nada beneficiou. Lembrei, noutro escrito, que a causa foi, precisamente, a destruição dos laboratórios.

A investigação que foi protegida (e mal...), nas universidades, talvez produza mais papers, alguns em trabalhos de curto prazo, aqueles para que se conseguiu dinheiro, num sistema de financiamento que considero profundamente errado. Tal sistema é incompatível com boa produtividade em diversos sectores, como a investigação agronómica, com frequência a exigir bastantes anos e planificação a longo prazo (mas com resultados altamente compensadores), onde há colecções a manter e rotinas a cumprir.

Como tenho longa experiência de trabalho em Portugal e noutros países (Suécia, Grã-Bretanha e Estados Unidos) posso afirmar que o trabalho em Portugal custa bem mais tempo e esforço do que naqueles países. Além de carências várias, a espantosa burocracia envolvida custa aos cientistas muito mais esforço e tempo do que naqueles países. E a correcção do sistema não exige verba.

Em 1990 publiquei o artigo “Desburocratização – um caso pontual à consideração do Senhor Ministro das Finanças”, onde propunha uma simplificação que nada custava ao Estado e muito facilitaria a vida dos cientistas. Esse artigo foi premiado com uma menção honrosa num concurso da Secretaria de Estado da Modernização Administrativa, mas nada se alterou. Preferia não receber a menção honrosa mas ver o sistema corrigido.

 

Investigador coordenador e professor catedrático, jubilado

 

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The System of Rice Intensification

por papinto, em 15.12.13
Carlos Aguiar
Esta é uma das mais extraordinárias histórias da agronomia contemporânea.
Em 1983, o Padre Laulanié, um agrónomo jesuita radicado em Madagáscar, acompanhou, por puro acaso, um perigoso contratempo num viveiro de arroz: as sementeiras atrasaram-se e os agricultores foram obrigados a transplantar plântulas de arroz com apenas quinze dias.
Uma contrariedade transformou-se numa fantástica descoberta. Laulanié constatou que plântulas transplantadas com 2-3 folhas são substancialmente mais produtivas que plântulas mais velhas (com mais de 4 folhas).
Além da curiosidade e da perspicácia do inventor, Laulanié tinha uma outra enorme qualidade: a sua "initial technical incompetence and thus absence of conventional ideas".
Seguiram-se em catadupa outras descobertas, e recomendações:
1) Transplantação rápida do arroz (com um pequeno torrão), o mais tardar em 30 min;
2) Plantação a 1-2 cm de profundidade;
3) Plantação espaçada e regular (compasso 25x25 cm) de plantas individuais;
4) Controlo mecânico das infestantes com alfaias simples;
5) Humedecimento diário do solo (antes da floração), intercalando vários períodos (de ca. 4 dias) em que solo não é regado (e seca superficialmente).
E como que por magia, sem variedades melhoradas, sem mais azoto, com menos sementes e um trabalho menos duro, a produtividade aumentou 100 a 250%!
Diz o Padre Laulanié: "many examples are there to show that we need to master production techniques first before calling on to genetics. Improving the management and the methods leads almost always to increased yields, until a ceiling has been reached. At that moment selecting higher performance varieties makes sense, but these will develop their full potential only if the techniques have been totally mastered, so that mastering production techniques ought to be the first step."
Com pouca tecnologia, com um arranjo ali, uma pequena inovação acolá, escapando à armadilha que é o uso maciço de energia fóssil, pode-se aumentar a produtividade e a estabilidade da produção agrícola ... e a qualidade de vida das pessoas.
http://sri.ciifad.cornell.edu/

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In photosynthesis, solar energy is captured and used to produce chemical fuel by a photosynthetic organism. This project is designed to improve the efficiency of this capture and conversion by: 1) separating them into two types of cells: one that captures solar energy and another "factory" cell that produces fuel; and 2) enabling these two different types of cells to communicate with one another via the flow of electrical currents between them. Compartmentalizing the processes of energy capture and fuel production into two different types of cells will allow researchers to optimize environments for each process, and thereby improve the efficiency of each process. (Credit: Zina Deretsky, NSF)

ScienceDaily (Mar. 29, 2011) — Scientists in the United States and the United Kingdom have been awarded funding totaling more than $10.3 million to improve the process of biological photosynthesis. The U.S. National Science Foundation (NSF) and the U.K. Biotechnology and Biological Sciences Research Council (BBSRC) collaborated in issuing these jointly funded awards.

Photosynthesis allows biological systems to use sunlight and carbon dioxide to produce sugars and oxygen. This process is ultimately responsible for the food we eat and the fossil fuels we burn today.

Four transatlantic research teams will explore ways to overcome limitations in photosynthesis that could lead to the development of new methods for significantly increasing the yields of important crops for food production and/or sustainable bioenergy.

The funding agencies used a novel method called an "Ideas Lab" that led to these awards. Ideas Labs are based on the "Sandpit" concept initially developed by the Engineering and Physical Science Research Council (EPSRC) and are designed to stimulate new conversations about old problems.

In September 2010, an Ideas Lab was held in Asilomar, Calif. that focused on stimulating thinking in promising new, or currently under-developed, research areas relevant to photosynthesis. The workshop's goals were to develop innovative and transformative ideas on how to enhance photosynthesis through a multi-disciplinary approach and to bring together researchers to explore new and exciting avenues for future research in photosynthesis across all disciplines.

The result was the generation and real-time review of high-risk but potentially high-impact proposals for increasing the efficiency of photosynthesis.

NSF and the BBRC are now releasing four awards for proposals--each of which addresses a different bottleneck in photosynthesis--that were produced through the alternative approach pioneered at the Ideas Lab. NSF is contributing a total of $5.2 million to support U.S. participants in these projects.

"Photosynthesis is essential for life on Earth," said Joann Roskoski, NSF's acting assistant director for Biological Sciences. "By providing food and generating oxygen, it has made our planet hospitable for life. This process is also critical in addressing the food and fuel challenges of the future. For decades, NSF has invested in photosynthesis research projects that range from biophysical studies to ecosystem analyses at a macroscale. The Ideas Lab in photosynthesis was an opportunity to stimulate and support different types of projects than what we have in our portfolio in order to address a critical bottleneck to enhancing the photosynthetic process."

BBSRC's Director of Research Janet Allen said, "Photosynthesis has evolved in plants, algae and some other bacteria and in each case the mechanism does the best possible job for the organism in question. However, there are trade-offs in nature which mean that photosynthesis is not as efficient as it could be--at around only five percent, depending on how it is measured. There is scope to improve it for processes useful to us by, for example, increasing the amount of food crop or energy biomass a plant can produce from the same amount of sunlight. This is hugely ambitious research but if the scientists we are supporting can achieve their aims it will be a profound achievement."

Joanne Tornow, NSF's acting executive officer for Biological Sciences added that "The Ideas Lab is an innovative method for generating new ideas and building new teams of researchers that will undertake potentially transformative projects in areas of high impact, such as photosynthesis. Although NSF's award portfolio is already filled with exciting investments that hold great potential for advancing the frontiers of knowledge, trying new approaches could result in expanding the portfolio in new and unanticipated ways."

The four projects that were selected for funding at the Ideas Lab will conclude in about three years.

"The world faces significant challenges in the coming decades--and chief among these is producing enough sustainable and affordable food for a growing population and replacing diminishing fossil fuels," said Allen. "Even a small change to the efficiency of photosynthesis would make a huge impact on these problems. As these are global challenges, it is apt that we are working across national and scientific boundaries to put together truly international and multidisciplinary research teams."

When the four funded projects conclude, the two funding agencies will examine the approaches taken by these projects for addressing photosynthetic energy in order to determine whether the Ideas Lab approach realized its potential to generate novel and potentially transformative outcomes.

Summaries of the four funded projects follow:

  1. Plug and Play Photosynthesis led by Anne Jones of Arizona State University: This project is designed to separate the capture and conversion of solar energy into fuel--processes that may be completed by a single cell--into two different organisms that would communicate with one another through electrical currents flowing between them. This separation of photosynthetic processes into different organisms will enable researchers to optimize environments for each of these processes and thereby improve their efficiency.
  2. Exploiting Prokaryotic Proteins to Improve Plant Photosynthesis Efficiency (EPP) led by Stephen Long of the University of Illinois: A metabolic process known as photorespiration reduces the yields of plants including major crops, such as soy, wheat and rice, by an estimated 20 percent to 50 percent. Some blue-green algae have protein structures, called carboxysomes, that reduce such losses. This research aims to adapt and engineer these protein structures into crop plants to minimize photorespiration and boost yield.
  3. Multi-Level Approaches for Generating Carbon Dioxide (MAGIC) led by John Golbeck of Pennsylvania State University: Through this project, researchers will attach to the membranes of photosynthesizing cells special proteins that will pump carbon dioxide from the atmosphere into cells. Resulting increases in the availability of carbon dioxide inside these cells will inhibit photorespiration and promote photosynthesis.
  4. Combining Algal and Plant Photosynthesis (CAPP) led by Martin Jonikas of Stanford University: The unicellular green alga Chlamydomonas has a pyrenoid--a ball-shaped structure within the cell that helps this algae assimilate carbon to improve its photosynthetic efficiency. The goal of this project is to characterize the pyrenoid and associated components, and transfer them to higher plants in order to improve their photosynthetic efficiency.

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Paper tigers

por papinto, em 29.03.11

Mar 29th 2011, 15:14 by The Economist online

The countries with the biggest share of academic citations

SCIENCE is becoming bigger and more global. That, at least, is the conclusion of a report published by Britain's Royal Society, the world’s oldest scientific academy. Emerging scientific nations are gaining influence, as measured by how often their researchers get cited in peer-reviewed journals. China and Spain, with 4% and 3% of global citations in 2004-2008, respectively, pushed Australia and Switzerland out of the top ten for the previous five years. Countries like the United States and Britain retain the the most clout, though. Together they still account for 38% of global citations in 2004-2008, down from 45% in the previous five years. Boffins the world over are also citing more eagerly, on average, than they used to. Citations grew by 55% between 1999-2003 and 2004-2008. Meanwhile, the number of published papers grew by just 33%. The growth in citations could be partly down to an increase in the proportion of published papers that are the product of international collaboration to 35% of the total, up from 25% 15 years ago.

 

Ler o relatório aqui

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2011 03 28 Knowledge Networks Nations

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Marta F. Reis, Publicado em 07 de Janeiro de 2010  |  Actualizado há 5 horas

Director do Serviço de Ciência da Gulbenkian afirma que o sistema universitário tem que mudar:" 14 universidades é incomportável"

 
 

Galileu disse que a luneta dava para ver os navios ao longe e o senado italiano duplicou-lhe o cachet e ofereceu-lhe um cargo vitalício. Não aceitou porque queria ir mais longe. Há exactamente 400 anos registava as primeiras observações de Júpiter, o primeiro produto da ciência moderna. Para João Caraça, director do Serviço de Ciência da Fundação Calouste Gulbenkian, a mensagem é actual: é preciso investir nas ideias dos jovens, e na ciência de longo prazo. E motivar o país para a inovação.



O que mudou nestes 400 anos?

Na ciência entendida como a procura das leis da natureza não há nenhuma mudança. Mas a ciência hoje é um contínuo entre dois extremos: o que é a ciência moderna desde os tempos de Galileu e um outro pólo, que é a procura de novas tecnologias de base científica.



E que hoje é o pólo dominante?

Está a puxar praticamente a ciência toda. Que seria de nós hoje se não houvesse computadores nem redes? Temos 6700 milhões de habitantes, seriamos reduzidos a metade, que era aquilo que as tecnologias de 1950 suportavam como população do mundo.



Mas é uma tendência com consequências negativas?

É tão boa ciência como a outra. O problema é que toda a actividade científica começa a ser guiada pelos imperativos de curto prazo, e a ciência não é só resolver problemas mas descobrir grandes regularidades, propor novas concepções do mundo.



Podem estar a escapar novas oportunidades?

Isso nunca saberemos. Mas olhando para a história do conhecimento vemos que as ideias fora da norma são as que têm mais potencial no futuro. É preciso que estas ideias não fiquem escondidas na cabeça das pessoas, e a melhor altura para se fazer isso é quando se é jovem. Um jovem obcecado com um problema pode, sem receio de ir contra toda a sua maneira de pensar e contra o está estabelecido, propor um novo princípio.



São dadas boas oportunidades aos jovens cientistas?

Estes jovens não têm de ser trabalhadores com contrato, isso é mais tarde. O que precisam é de uma grande liberdade para pensar, e de orientadores com capacidade para os deixar trabalhar até encontrarem soluções. Quando Galileu olhou para os satélites de Júpiter, que utilidade é que isso tinha? Inicialmente propôs a luneta para olhar para os navios ao longe e o senado italiano até lhe duplicou o salário e ofereceu-lhe um cargo vitalício, mas ele não quis.



O financiamento dessa ciência mais abstracta é um problema?

Temos de ter meios para suportar a actividade destas pessoas - todas são úteis, umas sabemos quando e outras não. Para as que sabemos que são úteis estamos mais dispostos a canalizar recursos. Uma grande actividade que se tornou industrial como ciência precisa de ser financiada, gerida, avaliada, como qualquer actividade dos serviços. Tratar a ciência desta maneira faz com que a ciência perca um pouco da sua criatividade e espontaneidade. O problema é introduzir neste mecanismo uma parcela que permita que a faísca continue a chispar. Há pessoas que dizem que se devia guardar 10% dos fundos para investigar de uma maneira não comprometida com objectivos e 90% com objectivos.



E há condições para isso?

Neste momento em Portugal o financiamento público é metade do financiamento total. Já é muito bom, não está invertido. Mas devíamos ter mais fontes de financiamento. Nos EUA há a National Science Foundation - cá temos a Fundação para a Ciência e Tecnologia. Mas quando nos EUA é criada a NSF são também criadas agências nacionais para tratar de problemas de investigação em áreas interdisciplinares - na energia, no espaço, na saúde. Nós aqui não podemos só com uma agência para a investigação académica resolver o problema da tecnociência.



O sistema universitário português tem de mudar?

Temos de perceber que as universidades não são todas iguais, e não podem ser. Há universidades que podem estar viradas para um excelente ensino, nem todas podem ter grandes laboratórios de investigação. Seria preciso desagregar algumas universidades e reconstituir algumas. Levaria a que, por exemplo, Portugal tivesse uma universidade tão atractiva e competitiva como as melhores universidades do mundo. Não vamos poder ter as 14, é incomportável. Essa discussão não foi feita e devia ter sido.



Passa pela revisão da Lei da Autonomia das Universidades?

A Lei da Autonomia das Universidades não dá autonomia. Para haver autonomia era preciso um dote de capital. Nos Estados Unidos as universidades de investigação não dependem de nenhum ministério. Na Europa isso é impossível: temos um sistema de vida política baseado na condução dos negócios públicos pelo Estado. Não haverá nenhum ministro que não sinta às vezes a vertigem de intervir numa universidade.



Com consequências?

É o que temos na Europa. Temos de constituir um modelo de universidade que permita a sua diferenciação.



É uma questão em debate?

Não se discute a fundo porque a situação política não permite uma grande reorganização administrativa. Nós não sabemos bem o caminho da União Europeia. Apesar de tudo aquilo que foi conseguido, neste momento a Europa está mais desagregada do que já esteve. Seria preciso um enorme consenso.



Há razões para se estar optimista com a evolução da ciência em Portugal?

Os fundos estruturais permitiram que hordas de jovens não só se dedicassem à investigação como percebessem que isso é fascinante. Agora estes jovens precisam de emprego, de carreiras, científicas ou não. Esse é o problema de um país como o nosso, onde houve uma formação muito acelerada e boa, que nos deu um certo amor-próprio.



As políticas do governo vão nesse sentido?

Têm sofrido sistematicamente de uma dificuldade: pôr o sector privado em ligação com o sector público. É aqui que vejo o maior problema nacional. Os ministros podem falar muito bem uns com os outros mas não vemos os serviços e os ministérios articularem-se e não temos um conjunto de entidades públicas ou privadas a aparecer no sistema com objectivos comuns. Olhamos para o país e vemos que as estruturas que existem estão cheias. Se queremos atingir o dobro do número de investigadores portugueses, não podemos ter o mesmo número de instituições. Isto não é como num balão, soprar... É preciso crescer de forma diversificada.



A estratégia nacional tem sido a adequada?

Tivemos um plano tecnológico, mas precisávamos de um plano nacional para a inovação, que já devíamos ter há dez anos. Durante esta década alguns países gastaram mais de 3% do PIB em I&D. O 25 de Abril preocupou-se com a democracia: dar condições para a livre concorrência. Não houve muito tempo nem muito espaço para discutir estas questões, porque isto era contra a cultura das elites que dirigiam o país. Cabe agora um grande esforço para as pôr de novo na agenda e fazer com que o país dê um salto. Não podemos estar contentes com este estado de coisas. É preciso pensar que todo o mundo está a caminhar neste sentido. Uns já partiram em pole position, outros partiram atrás, mas têm uma passada brutal.



Portugal deve apontar para a

vanguarda?

Eu acho que o querer ser primeiro não dá, é uma coisa efémera. O bom é estar na liga dos primeiros, garante-se uma visibilidade muito grande. Agora temos de nos especializar em algumas áreas, como noutras alturas do passado.



O novo centro de nanotecnologias é um bom exemplo?

Não chega. Temos de ter toda a cadeia, da educação à investigação e ao negócio, à indústria e aos serviços. Não basta ter uns institutos - são peças de um lego que é preciso ligar, porque senão podem ser ligadas a outros sítios e perdemos a capacidade de as coordenar.



Que leitura faz do país neste momento?

Não vemos emergir os políticos que vão ser os grandes responsáveis pela condução do país entre 2020 e 2040, e temos de os ver. Precisamos de mais debate político sobre as grandes questões. O presente é um palco de conflitos, e nós estamos de um lado: vemos sempre algo que contraria a vontade de mudar e de criar novas oportunidades. Temos de lutar contra isso sistematicamente.

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