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LOPO DE CARVALHO Público 10/05/2016

Parece-me claro que tudo pode fazer mal, dependendo da dose em que se consome.

É com gosto que sigo de perto o trabalho desenvolvido no Parlamento Europeu pelo advogado e eurodeputado Português José Inácio Faria. Felizmente para Portugal, encontramos no Dr. Faria uma pessoa moderada, também pelo grupo parlamentar em que se insere, e que toma habitualmente posições políticas baseadas em pareceres científicos e pouco em crenças ou opiniões provenientes do lóbi de diferentes ONG.

Presentemente, a Comissão Europeia, em conjunto com os 28 Estados-membros, discute a renovação da autorização de comercialização do glifosato. Esta instituição europeia deixou já claro que o poder de decisão neste assunto incide sobre os Estados-membros e não sobre a Comissão ou sobre o Parlamento Europeu. Felizmente que assim é, pois que a discussão parlamentar ocorreu e ocorre, a cada dia, de forma extremada, muito de acordo com critérios políticos e pouco ou nada sob escrutínio técnico.

Em matéria científica, o estudo da questão é sempre desenvolvido por um Estado-membro. Neste caso concreto, foi a Alemanha que tomou as rédeas. Posteriormente, num processo longo e complexo, mas muito transparente, a Autoridade Europeia para a Segurança dos Alimentos (EFSA) deve pronunciar-se. Felizmente para os agricultores, esta entidade europeia não encontrou no glifosato problemas de maior.

Convém recordar que toda esta polémica surge após os estudos realizados pela Agência Internacional de Pesquisa em Cancro (IARC). Resumidamente, tais estudos concluíram que o glifosato era de molde a alarmar as populações. Devemos naturalmente ser prudentes, nomeadamente no que à saúde da população diz respeito. Mas vejamos: os estudos feitos em ratos consistiram em alimentar os animais com glifosato até estes desenvolverem cancro.

Este artigo poderia terminar por aqui. O glifosato não é, naturalmente, para beber, e julgo que ninguém questiona este facto. Contudo, esta agência, que não representa toda a Organização Mundial da Saúde, tem emitido igualmente estudos alarmando as populações para os riscos relacionados com a ingestão de bebidas alcoólicas ou mesmo de carnes vermelhas.

Na União Europeia, a agência responsável pela avaliação dos riscos na nossa alimentação é, até ao momento presente, a EFSA e não a IARC. Em tema algum essa avaliação foi até hoje requisitada à IARC, por que motivo o seria agora? Atualmente, temos na Europa a melhor segurança alimentar à escala global, a qual, juntamente com as restantes instituições europeias, protege eficazmente os nossos consumidores, pelo que não faz sentido esta polémica que agora surge.

Em todos os seus estudos, a EFSA considerou sempre a opinião proferida pela IARC. Já o inverso não aconteceu: esta agência tomou uma decisão política e pouco ou nada transparente e técnica, jamais tendo atendido à opinião da EFSA a este respeito. A confusão instalou-se graças aos lóbis ambientalistas e ao seu trabalho contra um efectivo esclarecimento científico. Isto não obstante a indústria produtora de glifosato, representada por mais de 40 empresas europeias criadoras de inúmeros postos de trabalho, ter-se demonstrado já disponível para publicar os seus estudos.

Após a recente reportagem da RTP e demais meios de comunicação social a este propósito, ficamos com a ideia de que esta substância química é utilizada maioritariamente em jardins, pequenas hortas e outros motivos recreativos. Naturalmente que, estando esta reportagem assente num estudo apresentado por uma ONG anti-organismos com genética alterada, rapidamente se descobre o rabo-de-palha. Na verdade, a utilização do glifosato é, na sua esmagadora maioria, realizada por agricultores altamente profissionais que, ao utilizarem esta substância, evitam danificar o ambiente com substâncias piores, ou mesmo com práticas agrícolas que em muito iriam contribuir para uma grave erosão dos solos, perda de água e perda de nutrientes em grandes quantidades.

A agricultura de conservação, na qual o glifosato é peça essencial, evita a mobilização do solo por alfaias pesadas, permite uma enorme poupança nos gastos de combustível, promove um significativo aumento da biodiversidade dos solos e, claro, contribui para o aumento da matéria orgânica destes. Este tipo de práticas não só é subsidiada pelos cidadãos europeus através da Política Agrícola Europeia como é reconhecida pela comunidade científica como ambientalmente sustentável.

Com o aumento da população mundial, os agricultores devem almejar ser mais competitivos económica e ambientalmente. A exploração sustentável dos recursos, o rendimento dos agricultores – cada vez mais baixo – e os preços dos alimentos devem ser uma preocupação de todos nós. A segurança alimentar só ficará assegurada por práticas agrícolas económica e ambientalmente sustentáveis.

Em conclusão, parece-me claro que tudo pode fazer mal, dependendo da dose em que se consome. Hoje, quando beber um copo de vinho, lembre-se que este contém 1ppm de uma substância potencialmente cancerígena chamada glifosato. O mesmo copo de vinho contém 130 mil ppm de outra substância comprovadamente cancerígena: o etanol. Mas com esta já ninguém se rala.

Não beba glifosato, olhe que não é água!

Lobyista em Bruxelas para indústrias produtoras de glifosato e representante da Associação Nacional da Indústria para a Protecção das Plantas

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