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António Gabriel da Silva St'Aubyn

por papinto, em 19.04.16

antonio_staubyn.jpg10/mar/1937-18/abr/2016

Professor emérito do ISA

Professor catedrático de Matemática do ISA (1975-2002)

 

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ANDREA CUNHA FREITAS 

Um grupo de investigadores portugueses anda pelos pinhais deste país a perseguir o insecto Leptoglossus occidentalis , também conhecido por “sugador de pinhas”. Querem saber como este percevejo de cerca de 20 milímetros, que chegou a Portugal em 2010, está danificar o valioso pinhão.

 

É no pinheiro-manso (mais precisamente dentro das suas pinhas) que está o negócio e, por isso, é esta “opção alimentar” do percevejo que preocupa produtores e indústrias e que desperta o interesse dos investigadores. Aprodução de miolo do pinhão que chegou a render mais de 100 milhões de euros por ano tem caído, apesar do aumento da área ocupada pelos pinhais. Na última década, a área de povoamento do pinheiro-manso em Portugal aumentou 54%, ocupando actualmente 174 mil hectares. Quanto ao pinhão, ao qual alguns chamam "ouro banco", este valioso produto pode custar ao consumidor cerca de 100 euros por quilo. Hoje para conseguir pouco mais que um quilo do precioso fruto são necessários os mesmos 100 quilos de pinhas que há alguns anos davam para tirar quatro quilos. Dentro das pinhas, há cada vez mais pinhões que aparecem secos, deformados… sugados.

O trabalho dos investigadores começou em 2014 e em 2015 iniciou-se o trabalho de campo, que tem duas abordagens: a recolha de pinhas por todo o país (o insecto está espalhado do Minho ao Alentejo) e a experiência que se realiza na herdade da Machoqueira do Grou (em Coruche), onde alguns ramos de pinheiro-manso foram vestidos com mangas de poliéster com o “sugador de pinhas” no seu interior. Além disso, há a observação directa em laboratório com recurso ainda a raios X e microtomografia para a caracterização dos danos causados. O trabalho conta com a participação de investigadores do Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária (INIAV) e do Instituto Nacional de Investigação Agronómica de França (INRA, na sigla em francês), integrando ainda um projecto mais amplo chamado Pinea.

As pinhas recolhidas têm cerca de três anos (o tempo que a pinha demora a maturar), mas Ana Farinha já percebeu que os insectos podem atacar antes disso. “Já os vimos em pinhas com menos tempo e até em flores”, refere. Aliás, apesar de ainda ser cedo para certezas, a investigadora, que está a fazer a sua tese de doutoramento com este trabalho, já detectou outras características do “sugador de pinhas”. Aparentemente, os insectos “escolhem” uma vítima para atacar, sendo possível num grande pinhal encontrá-los apenas num único pinheiro-manso. Tal como já se disse, não escolhem a idade das pinhas e, do fruto, consomem apenas o endoesperma, deixando o embrião intacto. Como se comessem só a clara e deixassem a gema de um ovo. Esta preferência levanta outro problema, uma vez que é o endoesperma que constitui a reserva da semente e que permite que esta germine na terra.

Por outro lado, o Leptoglossus occidentalis não deixa marcas visíveis. “Nas amostras que recolhi, a pinha fica um pouco torcida mas não é fácil de detectar”, refere Ana Farinha, adiantando que este é um dos aspectos a esclarecer no seu projecto que só termina em 2017. Dentro de uma mesma pinha, os produtores encontram pinhões vazios, cheios e meio-cheios. “Queixam-se de que há cada vez mais vazios na mesma pinha.” O pinhão aparece enrugado e seco. “No trabalho em laboratório colocámos os pinhões com casca numas caixas com o insecto lá dentro e fomos radiografando de dois em dois dias. E de facto ele não deixa marcas, a casca fica inalterada”, conta Ana Farinha. Com uma fina “agulha” que tem na boca, o insecto faz um invisível furo nas “escamas” da pinha e alimenta-se do miolo do pinhão mesmo com a casca já formada.

O ano de 2010 foi marcante para este negócio. Foi, lembra Alexandra Correia, também investigadora do CEF/ISA, um ano de “uma safra excepcional com valores quatro vezes acima da média”. Depois disso, a produção caiu. O início da queda do negócio do pinhão coincide com o registo da entrada do Leptoglossus occidentalis em Portugal. Mas o insecto pode não ser o único culpado pela desgraça do pinhão. O clima, outras pragas ou mesmo uma questão genética devido a um excessivo recurso a enxertos para aumentar o cultivo do pinheiro-manso e que faz com que os vários exemplares sejam todos da mesma família, “irmãos de irmãos”, e, por isso, com características semelhantes, são outras das possíveis explicações dos investigadores para os problemas dentros das pinhas. Além disso, Alexandra Correia, que estuda estes ciclos de safra e contra-safra (boas e más colheitas), lembra que depois de “um ano de safra excepcional é natural que se registe uma quebra”. Ainda assim, nota a investigadora, Portugal continua a ser o país que tem a maior produção de pinha por área.

“O insecto pode ser um factor importante mas não o único. Também pode estar a servir um pouco de bode expiatório”, diz a Ana Farinha. Aliás, segundo esta investigadora, mesmo a coincidência encontrada em 2010 pode estar errada. Num artigo científico em colaboração com INRA, Ana Farinha traça a rota da invasão do insecto na Península ibérica. “Recolhemos exemplares vivos em toda a península e fizemos uma análise molecular, com marcadores mitocondriais e microssatélites que analisam as variações em escalas mais pequenas”, explica, adiantando que Barcelona terá sido a “porta de entrada” do insecto em Espanha, não existindo nenhum local específico que determine a entrada em território português. E uma vez que a entrada em Espanha data de 2003, Ana Farinha acredita que o insecto “tenha sido detectado tardiamente” em Portugal, que só o registou sete anos depois. “Percebendo como voa e se desloca, não me parece que tenha demorado tanto tempo para chegar a Portugal”, arrisca.

E não é possível exterminá-lo?

Nada como conhecer bem o inimigo para o conseguir derrubar. É também esse o caso. Ana Farinha explica que em vários países há várias experiências para encontrar a forma mais eficaz para exterminar o “sugador de pinhas”. Na Turquia, por exemplo, estão a testar o caminho dos pesticidas. Em Itália, conta a investigadora, a estratégia está mais virada para a introdução de um parasitóide da Califórnia (local de origem do Leptoglossus occidentalis) que, neste caso, é uma pequena vespa que se alimenta dos ovos deste insecto. E isso não poderá trazer outros problemas? “Pois, não sabemos”, responde Ana Farinha. Há também quem opte por “armadilhas com feromonas”, ou seja, cheiros capazes de repelir ou atrair para um outro local estes percevejos. Ana Farinha aposta na exploração da ecologia do insecto. “Sabemos que ele hiberna durante o Inverno, temos de saber mais sobre as suas preferências de abrigo e ver se o capturamos nessa altura”, propõe. Pois é. O “sugador de pinhas” hiberna durante todo o Inverno e aparecerá nos campos dentro de alguns dias, entre o final de Abril e início de Maio.

Ana Farinha não sabe ainda se vai encontrar muitos ou poucos “sugadores de pinhas” nos pinhais este Verão. “Eles têm uma dinâmica populacional confusa. No ano passado quase não o vi. Mas não sabemos porquê. Se for uma questão de alternância, vamos ver muitos este ano”. Os investigadores não sabem se vão encontrar muitos insectos nos pinhais e os produtores também ainda não sabem os pinhões que vão encontrar. Apesar de parecer que este ano há uma boa quantidade de pinhas, só depois de abertas é que se vê se o negócio vai correr bem. As investigações são muitas vezes como um bom romance policial durante o qual se seguem pistas, procura-se um culpado e que também podem ter momentos de suspense.

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